Grandes dias, pequenas existências
quarta-feira, novembro 30, 2005
  Paciência de Pescador
É talvez uma analogia mal amanhada e ilógica mas passei uma hora sentada com os pescadores lisbonenses, à beira do nosso Tejo plantados, e não aguentei muito mais a quietude das suas respirações. Se os chineses são pacientes, então aqueles pescadores eram, lá bem no fundo, chineses puros. Por um tempo a minha respiração foi também a deles mas logo voltou à realidade e se fez sua novamente. Os pescadores, esses, lá ficaram; com um peixe a saltitar num balde e muitos outros à espera dos seus. Simplesmente, à espera. Envoltos no silêncio de quem pesca com paciência e de quem, com virtude, vai fazendo por si. Com passos e ondas e um bater constante e igual que é colhido pela pedra, faça chuva ou faça sol. J.A.V.
 
sexta-feira, novembro 25, 2005
  Tributo a Cintia
Arrasto-te manualmente
Meu tacto ainda é o valor do meu corpo
Repudio qualquer outro contacto!
Se te vejo desfaço-me dos olhos
É deveras incómodo sentir-te por aí,
Há aquela armadilha do fácil belo.
Aquarela arranjo outra
Quando percebo tua cintilação,
Cores violetas de borboletas desnudadas
Entra pela minha língua
Aquando do contacto bocal
Visões acima.

Meu teu é teu teu
Meto-te no meu ter
Para sermos.

Sinto-te delgado quando igual a mim
E melhor quando possuis seu igual aos outros
Não se desfaça do que me une a ti
Variações dos mesmos seres...
Enxerto de ossos
Conteúdo desflorado do meu toque
Que eu te dou
Cintia Pomes
Pelas coincidências... J.A.V.
 
  Antes da criação II
Pensando melhor, a culpa de não ter que escrever é inteiramente minha. Até porque o medo de partilhar os escritos que me preenchem é avassalador. Lá dizia o outro: que há uma data de coisas das quais nos livraríamos se não tivéssemos medo de que outros ficassem com elas. Sim, sou assim egoísta. J.A.V.
 
  Individualizador automático de Poesia
Somos de barro. Iguais aos mais. Ó alegria de sabê-lo! (Correi, felizes lágrimas, por sobre o seu cabelo!)
Depois de mais aquela confissão, impuros nos achamos, nos descobrimos frutos do mesmo chão.
Pecado, Amor? Pecado fôra apenas não fazer do pecado a força que nos ligue e nos obrigue a lutar lado a lado.
O meu orgulho assim é que nos quer. Há-de ser sempre nosso o pão, ser nossa a água. Mas vencidos os ganham vencedores, nossa vergonha e nossa mágoa.
O nosso Amor, que história sem beleza, se não fôra ascensão e queda e teimosia, conquista... (E novamente queda e novamente luta, ascensão...) Ó meu amor, tão fria--se nascêramos puros-- nossa história!
Chora sobre o meu ombro.
Confessamos.
E mais certos de nós, mais um do outro, mais impuros, mais puros nós ficamos.
Sebastião da Gama
 
quarta-feira, novembro 23, 2005
  Antes da criação
Antes de criar este blog, ideias e textos a tomar forma proliferavam a minha cabeça. Agora não consigo passá-los para aqui. J.A.V.
 
sexta-feira, novembro 18, 2005
  Usar a cabeça
Pensar é a recreação por excelência.
Devia ser um deleite generalizado. J.A.V.
 
  Sete estrelas no céu, com a forma de um tacho
O que é ganhar sono?
Não sei. É olhar para o ecrân e esperar que ele venha, suponho. Queria-me ir deitar mas precisava de te dizer para não esqueceres os beijinhos. E depois fiquei a mirar-te por aqui; ou a mirar uma das fotografias que tenho tuas na cabeça, de olhos fechados. Não sei bem.
Este tempo todo?
Acho que sim. Naõ me lembro de ter feito mais nada. Portanto, acho que sim. Boicotaste-me os últimos trinta minutos sem saberes. Aaaaah pah, sabes lá tu! Os boicotes são tantos que acho que já não são muitos mas um único prolongado à exaustão do fim do mundo (seja lá quando for que isso seja). Quer dizer, se calhar com o fim do mundo o boicote não acabava. Tens esse poder, sem dúvida.
Hmm... 'Tá bem.
Boa reacção. Nada previsível, nem nada.
Oh.. Eu não gosto que digas essas coisas. Esses exageros têm de ser rematados com um «'Tá bem». O que é que te passa pela cabeça nesses minutos?
Quais minutos?
Os que eu boicoto. Se é que isto se diz.
Penso em ti a nadar de costas e eu a ver-te de cima, como se pairasse sobre ti sem saberes. Isto é mais o que eu vejo, uma das muitas coisas. Foi o que vi há pouco. Estavas assim relaxado, como sempre. Calmo e recatado. Confiante. Bonito. Inspiras-me nestes momentos. Também nestes. E acho que não penso em nada de especial. Só na conspiração dos deuses a meu favor quando cruzaram as nossas histórias. Sei lá... Estou para aqui a discorrer e só saem baboseiras mas não é como se houvesse grande ciência na coisa. Isto é de facto o que eu penso. Isto e muito mais. Está bem assim?
Mais ou menos. Está.
Mais ou menos porquê?
Está.

Com essas coisa bonitas que presunçosamente julgamos dominar, sós. J.A.V.
 
domingo, novembro 06, 2005
  Fiel?
Ontem fui ao cinema sozinha, coisa que muito me apraz (como deduziram os fiéis leitores desde a primeira crítica cinematográfica aqui postada).
Era já longo o desejo de ver "The Constant Gardener"; desde que ouvira falar do filme pela primeira vez, há coisa de meio ano, para ser honesta. E só é uma a razão porque não escrevi ontem este post : a reflexão. Merecida pelo aclamado realizador Fernando Meirelles (aos incautos, o realizador do aclamado "Cidade de Deus"), merecida pelo não-tão-aclamado-como-devia actor Ralph Fiennes.
Não foi, de todo, uma reflexão filosófica ou globalista como se esperaria, pois da realidade controversa e revoltante que se vive há longas décadas em territórios ricos de pessoas mas pobres de espíritos e de humanidade crua, tenho eu perfeita noção de há uns centímetros de "adulta à força" a esta parte. É antes, isso sim, uma reflexão um tanto sentimentalista e a dar para o profundo acerca de uma questão que me assaltou desde a primeira imagem que surgiu no ecrân gigante. E se a imagem deriva, em grande parte, do talento de Ralph que, em um minuto, conseguiu, sem emitir sons ou expressões faciais, demonstrar de uma maneira tão pura a dor da perda, ou dos dotes de manejar a câmara de Meirelles, a pequena parte que sobra vem do puro tormento que provoca a própria Perda, da que ao longo dos tempos se vai dividindo e multiplicando em perdas pequenas. E não sei se pela perda ou se pela acção de algo maior, "O Fiel Jardineiro" é uma prova irrefutável de que, sem cerimónias ou extravagâncias, um sorriso é sempre um sorriso e a inexistência de uma lágrima é a inexistência de uma lágrima. Puro e simples. Fora com as conotações e análises psico-sociológicas do pormenor X da atitude Y de fulano face a sicrano. Acho que no fundo o filme acaba por demonstrar o sentir despido de sentimentos. A necessidade inocente e inconsciente, assim fundamental e sem perguntas. A necessidade Fiel? A necessidade irresoluta, incessante. O jardineiro é incessante no sentir fundamental. E isso poderíamos deduzir sem sequer ver mais do que os cinco minutos iniciais do filme; bastava-nos a expressão de Fiennes quando lhe é dada a notícia de perda (e a de Weiss ao saber que as gentes do mundo, a sua necessidade fundamental e incessante, estão a ser mortas por dá cá aquela palha.) J.A.V.
 
terça-feira, novembro 01, 2005
  Meandro transparente
A minha afilhada perguntou-me há pouco ao telefone:
--Madrinha, deste o meu desenho ao Francisco?
Ao que eu respondi:
--Dei pois.
--Ele gostou?
--Gostou.
--E chegou a acabar de pintá-lo?
--Sim, amor, chegou.--disse eu.
Ao que ela respondeu, indignada:
--Sabes lá tu se pintou!

Há pessoas bastante transparentes, até frente a pessoas pequeninas de 6 anos.
Têm é sempre a sorte de se darem com gente, pequena ou grande, que gosta de transparências. J.A.V.
 
Complexo e intangível,nervoso e irrequieto, intrincado e obnubilante, balbúrdico e heteróclito, marafado e perscrutante, mírifico e adstringente, contráctil e obstipante, cataclísmico e necrófilo, hemorrágico e micótico,extra-fofinho ou nada fofinho, observador e acutilante.. ou nem tanto... Truísmos (extra)ordinários (des)mistificados aqui partilhados.

Escreve-me:
ursula.iguaran@hotmail.com


(os ditos tempos já decorridos):
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